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Covid-19 – Coronavírus e a indústria do sexo

 

“Aqui está a sua gorjeta atrasada!”

 

Queridos todos dessa comunidade, clientes e profissionais do sexo,

 

Para quem não me conhece, meu nome é Cristiano Terra. Tenho 34 anos. Sou garoto de programa e massoterapeuta há 3 anos dos quais 2 anos e meio atuei exclusivamente em Brasília. Antes de mais nada, gostaria de esclarecer: não estou em Brasília agora. Como muitos de meus amigos e clientes mais próximos já sabem, eu tinha planos de me mudar para Nova Zelândia para continuar meus estudos, mudança essa que conquistei em agosto de 2019 graças a ajuda de todos vocês. Sinto saudades de todos e para quem quer matar as saudades, podem entrar em contato pelo WhatsApp. Porém venho hoje tratar de um assunto muito sério que aflige muitos trabalhadores do sexo e a respeito do qual peço atenção urgente.
 

 

Todos aqui já sabem que estamos passando por uma pandemia que afeta sem exceção dos os países do globo. O mundo inteiro tem se unido ao redor do Covid-19 para lutar contra a pandemia e a crise causada por ela. A ação coletiva é extremamente necessária para a maior agilidade possível na resolução desse problema. A recomendação da OMS para solucionar este problema está em práticas de isolamento e detalhados hábitos de higiene.

 

Como Covid-19 afeta a indústria do sexo? Bem, pode parecer óbvio, mas em meio a uma crise global muitos não pararam para pensar sobre isso. Um encontro íntimo entre clientes e trabalhadores do sexo vai contra o princípio básico de isolamento proposto para proteção contra o Covid-19. Para um encontro bem-sucedido, beijos, abraços, carícias, massagem, toques, contato físico, calor humano, conversar olho no olho, são itens essenciais. Nada disso pode ser feito a 2 metros de distância. As possibilidades seguras de encontro ficam reduzidas a sexo por telefone ou sexo por ligação de vídeo. (Não se esqueçam de passar álcool na tela do celular antes de lamber, rsrs.) Obviamente não é contato virtual que os clientes procuram, não é mesmo?

 

O que acontece? Trabalhadores do sexo se torna de todas as classes uma das mais vulneráveis e fragilizadas. Isso é grave! Cabe lembrar alguns fatos essenciais. Para a grande maioria dos trabalhadores do sexo, a prostituição não é uma “renda alternativa”. É a principal renda, quando não a única. Muitos de nós usamos nossa renda para ajudar nossa família, alguns de nós somos casados, alguns temos filhos, alguns temos pais, mães, irmãos que dependem da nossa contribuição. E lembrem-se, nós trabalhadores do sexo (e “do amor” se me permitem adicionar aqui), temos despesas altas como aluguel de espaços próximos ao centro que escolhemos criteriosamente para proporcionar privacidade, segurança, conforto e conveniência para nossos clientes. Tudo para oferecemos serviços de excelência. E mais um agravante, por pertencermos a economia informal, a maioria de nós não tem acesso a licenças, benefícios e auxílios do governo.

 

Por que estou falando sobre isso? Bem, acredito que vocês saibam onde eu vou chegar. Em plena crise, observem quantos anúncios ainda estão ativos. Com drástica perda de renda, falta de recursos para despesas básicas e amparo de nossos dependentes, nós profissionais do sexo sentimos uma enorme pressão para assumir riscos e nos manter atuantes durante a crise. Acontece que nós trabalhadores do sexo também queremos participar dessa luta contra o Covid-19, mas para isso precisamos da sua ajuda.

 

Sei que muitos de vocês estão em situação de instabilidade, com perda de renda, ou insegurança no emprego. Mas para aqueles que podem transferir suas atividades profissionais para casa, pratica-as em isolamento e estão com sua renda assegurada, peço ajuda em nome de todos os profissionais do sexo. E como vocês podem ajudar? Existem várias formas de solidariedade. Vocês podem ajudar como quiser, as aqui vão umas sugestões:

 

1.    Gorjeta atrasada. Sabe aquele(a) garoto(a) dedicado(a) que lhe proporcionou momentos inesquecíveis? Ele(a) pode estar com contas atrasadas e sem dinheiro para necessidades mais básicas. Verifique como você pode ajudar. Se possível que essa contribuição seja semanal. Outra forma de pensar: Sabe aquela gorjeta merecida que você não pagou no último encontro? Dê agora. “Aquele encontro foi show! Obrigado! A propósito, aqui está sua gorjeta atrasada.”

 

2.    Contratem serviços futuros. Isso mesmo, pague hoje pelo serviço que você vai receber depois da crise. Ao invés de simplesmente doar, você pode contratar agora e aproveitar mais tarde. Isso pode ser essencial para cobrir uma despesa de aluguel, por exemplo.

 

3.    Doação. Nunca contratou? Não planeja contratar? Então doe. Se possível mantenha um valor semanal enquanto a crise durar. Melhor pouco constante que muito uma vez só.

 

4.    Compras. Não quer doar? Então considere a possibilidade de fazer compras semanais para alguém. Bem provável que isso alivie um pouco as despesas.

 

Para quem vê de fora, pode parecer muito fácil pedir ajuda, né? Mas não é. Chegar ao ponto de admitir a própria fragilidade e vulnerabilidade não é um local confortável de se estar. Temo inclusive que muitos profissionais do sexo me critiquem por essa carta que estou escrevendo. Mas sejamos todos sensatos. Estamos em um momento histórico crucial. Se cada garoto(a) de programa tiver o mínimo para pagar as contas e sobreviver à crise causada pelo Covid-19, a pressão para se arriscar em atendimentos diminui e dessa forma protegemos todo mundo. Por isso que sua ajuda é tão necessária, para unirmos forças na luta contra o Covid-19.

 

Então em nome de todos os profissionais do sexo (e do amor) deste país (e do mundo), peço encarecidamente: Lembrem daqueles que foram tão atenciosos com você no passado. Está na hora de retribuir. Isso será essencial para protegermos a todos e vencermos o Coronavírus.

 

Grato,

 

Cristiano Terra

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